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Cannes Lions

20 A 24 DE JUNHO DE 2022

Em busca de um propósito para chamar de seu

Conscientes ou não, as marcas chamam para si a responsabilidade de fazer o mundo melhor


17 de junho de 2019 - 20h04

Neste primeiro dia em Cannes não fui em busca de um recorte entre os temas, mas ele aconteceu em função da oferta. Foi sobre propósito, causas e razões de ser das marcas. Acho essa uma boa forma de resumir uma das avenidas que a indústria consolida. Não é uma novidade, mas a dimensão e a preponderância são maiores do que nunca.

Ao que parece, 9 entre 10 marcas agem e se comunicam em função de um propósito. Os fóruns são sobre isso, os prêmios também. É um discurso quase unânime. E isso é muito bom, ainda que sujeito a questionamentos em alguns casos.

No painel “Future is Female” (Hulu, CNBC, Stich Fix e Kerry Washington) ouvimos sobre como as mulheres decidem sobre 85% do consumo e que por isso as organizações se obrigam a um pensamento feminino. Isso molda por consequência toda a cadeia criativa: do produto à propaganda, passando pelo conteúdo. Logo, um discurso com uma causa feminina ganha espaço e se torna uma opção de propósito para as marcas.

No talk “A circle big enough for us”, o gigante do varejo Target mostrou como sua marca de roupas para crianças com necessidades específicas contribui para um propósito maior da companhia, que chamam de “Soul at Scale”. Em um discurso apaixonado sobre inclusão, a CDO queniana recorreu a um ditado do seu país sobre o valor da diversidade: “Sozinho se chega mais rápido, juntos chegamos mais longe”. E ao final ironizou sobre as alternativas das marcas que não fazem um bom trabalho ao buscar um propósito e aquelas que escolhem não buscar, preferia a segunda opção – “pois elas vão perecer”.

O recado implícito é que é preciso se movimentar nessa direção, no matter what. Ainda que erros sejam cometidos. Na discussão sobre pink washing, a ativista trans Charlie Craggs reforçou o ponto. Ainda que as marcas não ajam de forma 100% adequada na hora de incluir esta parcela da população LGBTQ+ em seus discursos, a contribuição tem saldo positivo por trazer visibilidade. “Existir” é uma opção melhor ao assassinato silencioso ao qual estão expostos os trans todos os dias, disse emocionada.

Ao fim do dia, na premiação, quase todos os leões de ouro foram para iniciativas com alguma causa ou propósito. Destaco o case de Ikea que criou um kit de peças plásticas para ser incorporados aos seus móveis fazendo possível sua utilização por pessoas com alguma necessidade motora específica (projeto open-source para impressoras 3D). Premiado com dois leões, um dos membros da equipe criativa venceu a escada do palco (tem sempre que ter uma?) corajosamente, com muitas dificuldades motoras, personificando toda a população reconhecida em suas necessidades com o projeto. Foi o ponto emocionante da noite.

Não há só uma razão simplista para chegarmos nesse consenso tácito em prol de propósitos. Há um movimento social importante das corporações que a indústria da criatividade acompanha. Ser socialmente responsável será cada vez mais requisito. Há também a própria razão principal de ser das marcas, que não é mais chancelar a qualidade de produtos ou criar vínculos emocionais. No limite há até uma dívida histórica da publicidade por contribuir com a discursos superados e modelos excludentes, hoje vistos como socialmente inadequados.

Sejam quais forem as causas, o que importa é que a direção é boa. Mas ainda há muito por fazer e isso ficou claro quando o Lion United Nations Foundation Grand Prix for Good foi negado. Nenhuma marca levou e todos ficaram com o dever de casa de fazer mais o bem para o ano que vem. Assim seja.

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