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Cannes Lions

20 A 24 DE JUNHO DE 2022

Tommaso Di Giovanni, diretor da Philip Morris: “Nosso propósito é um mundo sem fumo”

No passado, essa seria uma frase impensável, mas a companhia diz ter mudado e quer passar essa mensagem adiante e precisa de ajuda, inclusive da publicidade

Roseani Rocha
24 de junho de 2019 - 16h50

Di Giovanni: “Queremos que em 2025 40% das nossas receitas e volume de vendas sejam relacionados a produtos que não queimam” (Crédito: Celina Filgueiras)

Pelo segundo ano consecutivo, executivos da Philip Morris estiveram no Cannes Lions, entre eles o italiano Tommaso Di Giovanni, diretor global de comunicação para o que a empresa chama de “Smoke Free Products”. Em ótimo português, já que morou no Brasil (fez MBA na FGV-SP e trabalhou em Curitiba), Tommaso explicou ao Meio & Mensagem o interesse da companhia em se aproximar do universo da publicidade e do marketing. Citando dados da Organização Mundial de Saúde, que dão conta de que existe um bilhão de fumantes no mundo e a estimativa de que em 2025 esse número permaneça o mesmo, ele acredita que é preciso dar a essas pessoas alternativas e principalmente comunicar quais são elas e suas vantagens em relação aos cigarros de combustão.  Mas num contexto em que as marcas são cada vez mais cobradas – e isso ficou claro este ano em Cannes – em não apenas fazer o bom em termos de produtos, mas também o bem socialmente, em última instância, a Philip Morris não terá em algum momento de mudar totalmente de ramo de atuação? O executivo responde a esta e outras questões, na entrevista a seguir.

 

Meio & Mensagem – O que faz uma marca como a Philip Morris num festival como o Cannes Lions? No de cinema, entenderia, porque os cigarros sempre foram muito promovidos nos filmes.

Tommaso Di Giovanni – Deixe-me explicar que não promovíamos cigarros nos filmes. Eles acabavam aparecendo, mas isso é passado. Estamos aqui em Cannes porque o mundo do tabaco e da nicotina está mudando. Nos últimos anos, a tecnologia, a ciência e a inovação nos deram a possibilidade de dar aos fumantes produtos muito melhores para a saúde deles. A ciência está provando que esses produtos são muito melhores, muitos governos estão trabalhando nesse sentido, mas ainda tem muito a fazer. Se queremos mudar a saúde pública, através dessa oportunidade, precisamos dialogar e mudar algumas leis que são bastante antigas, porque foram feitas para o cigarro, nos anos 1980, 1990. É preciso ter um debate e informar os fumantes, por isso estamos aqui, para fazer uma chamada a quem trabalha na comunicação. Precisamos de ajuda para fazer essa mudança, que é muito grande. Sozinhos, não vamos conseguir. Precisamos de ajuda dos governos, dos cientistas, das ONGs e de quem trabalha em comunicação para, de verdade, mudar as percepções e ajudar quem fuma e, assim, a saúde pública.

M&M – Quantos produtos existem no portfólio “smoke free” da companhia?

Di Giovanni – Os novos produtos são cigarros eletrônicos, que esquentam tabaco, em vez de queimar. As pessoas não sabem que a maioria dos componentes tóxicos que você acha nos cigarros são gerados pela combustão. Quando se elimina a combustão acaba com 90%, 95% desses componentes tóxicos. Temos um produto que esquenta o tabaco a 350 graus Celsius no máximo. Num cigarro, chega a 900 graus. Isso muda substancialmente o que tem no vapor, que não é mais fumaça. E nesse produto que temos, que se chama Iqos, a diminuição é de mais ou menos 95%. Fizemos várias pesquisas clínicas, com fumantes, ex-fumantes e com quem usa esse produto. Os efeitos que vemos com quem usa são muito parecidos com os de quem parou de fumar. É uma oportunidade de saúde pública importante. A melhor coisa que um fumante pode fazer é parar de fumar, mas a verdade é que a maioria não para. Então, produtos como este podem ajudar a saúde pública enormemente, mas precisam ser encorajados, ter novas leis e uma mensagem clara para o fumante. Temos quatro tipos de produtos, dois que esquentam tabaco sem queimá-lo; um produto que usa a eletrônica para fazer isso e um que não usa. Temos outro produto ainda que combina dois líquidos, um ácido e uma base (um é a nicotina) e ele gera um sal de nicotina, mais puro. E estamos trabalhando nesse sentido. Por enquanto, temos no mercado o cigarro eletrônico na Inglaterra e o Iqos em 47 países, inclusive o Japão e, em breve, nos EUA, porque a Food and Drug Administration (FDA) autorizou a comercialização do produto a partir de agosto. Essa autorização é interessante, porque eles revisaram todas as nossas pesquisas e basicamente confirmaram a maioria das conclusões dos nossos cientistas.

M&M – Um dos temas mais falados aqui em Cannes este ano é propósito de marca. Qual o propósito da Philip Morris e como ele tem sido divulgado, dentro do que vocês podem fazer de comunicação?

Di Giovanni – Nosso propósito é um mundo sem fumo. Estamos lançando uma campanha chamada “Unsmoke”, que basicamente significa um mundo de onde você tira a fumaça. E se as pessoas não pararem, elas passam para um mundo onde não tem fumo ou combustão.  É o que estamos tentando, porque seria um mundo muito melhor para quem fuma, para quem se preocupa com os fumantes  e para a saúde pública. Para chegar lá, estamos investindo pesado. Investimos mais de US$ 6 bilhões nos últimos dez anos. Nos países onde vendemos Iqos, paramos de investir na comercialização de cigarros quase totalmente; investimos 90% em Iqos e 10% nos outros.

M&M – E os consumidores tradicionais não reclamam?

Di Giovanni – Pelo contrário. Onde existe Iqos, sete milhões de consumidores já pararam de usar cigarro e estão usando só o Iqos. O país onde temos maior sucesso é o Japão. Em dois anos, depois que passamos a comercializar o produto no país inteiro, 20% das pessoas pararam de consumir cigarro e passaram a usar produtos como o nosso. Ninguém teve uma mudança tão rápida num país.

M&M – E como vocês trabalharam o produto no Japão para ter esse sucesso?

Di Giovanni – Primeiro, o Japão permite comunicar um pouco mais que a maioria dos outros países, inclusive o Brasil, onde a lei é muito restritiva. Em segundo lugar, os japoneses têm historicamente uma tendência de gostar de inovação, gostam de eletrônica e gostaram, especialmente, de uma qualidade desse produto que é: ele não gera fumaça com cheiro de cigarro, logo, não incomoda quem está em volta. Como ele não queima, não gera cinzas também, não faz sujeira como o cigarro tradicional. E os japoneses gostaram muito disso, porque se importam muito com o outro e gostam de tecnologia. Mas tem outros países onde temos tido sucesso, um deles é Portugal, onde estamos com 4%, 5% de fatia de mercado (7% em Lisboa); Coreia, com 10% de participação. E temos Bulgária, Lituânia, Grécia (temos 10% de share em Atenas). E tudo indo muito rapidamente. No mercado de cigarros, quando se tem 1% de fatia de mercado no ano já é um sucesso e neste caso estamos falando de fatias muito maiores. Os consumidores apreciam o produto, o que precisamos agora é dar a eles uma informação clara, revisada pelas autoridades. E explicar que um produto que tem combustão não é igual ao que não tem, para sua saúde. As pessoas ainda acham que a nicotina é o problema principal, mas não é.

M&M – Mas a nicotina é o que causa o vício, não?

Di Giovanni – A nicotina faz parte do que causa dependência. Mas não é ela quem causa as doenças associadas ao fumo. Isso precisa ser dito claramente.

Segundo o executivo da Philip Morris, outras portas já estão se abrindo para a companhia (Crédito: Celina Filgueiras)

M&M – E como está o Brasil nesse contexto global?

Di Giovanni – No Brasil, o produto ainda não é comercializado. A lei ainda não mudou. É uma lei que foi feita para cigarro. Então, estamos acompanhando se e quando a lei vai mudar para dar aos fumantes do Brasil, uns 15% ou 12% do mercado, um produto melhor que cigarro. Não deixar para eles somente uma alternativa: parar de fumar ou consumir cigarro. Revisões de leis são processos que demoram. O país que está mais adiantado é EUA, mas começaram a discutir a lei em 2008 e em 2012 que a FDA publicou o que eles chamam de guidelines e começou um processo que basicamente funciona assim: se você tem um produto que faz menos mal e quer comunicar aos fumantes, passa para a FDA todos os estudos que tem, eles revisam e te autorizam primeiro a comercializar o produto e, depois, a divulgar “claims”, alegações  de redução de risco ou nocividade. Eles já liberaram a comercialização do produto e estão em fase final de avaliação para liberar os usos de claims de menor nocividade.

M&M – Mas em termos de mercado, o que o Brasil representa para vocês?

Di Giovanni – O Brasil sempre foi um país importante, mesmo com a legislação, porque é um país grande. Além disso, quando pensa no nosso objetivo que é o de que todo fumante pare de fumar, e se não parar totalmente de consumir tabaco que pelo menos passe para um produto melhor, é só questão de tempo para que possamos chegar ao Brasil.

M&M – Essa aprovação da FDA pode facilitar a liberação do produto em outros países, como o Brasil?

Di Giovanni – Acredito que sim, porque a FDA tem credibilidade. Para ter ideia, eles têm 600 pessoas trabalhando em questões relacionadas a tabaco & saúde e comercialização de tabaco. O que a FDA decidir claramente será olhado de perto por outro governos. Se você ler as 80 páginas que acompanharam a decisão da FDA de nos deixar comercializar o Iqos tem muita análise científica. Na questão da composição do vapor do Iqos, por exemplo, dos 10 estudos que existem a respeito, oito são totalmente alinhados aos nossos e os dois que não são alinhados têm uma metodologia inadequada. Há cerca de 30 estudos independentes sobre o Iqos, e os outros governos vão olhar para o que a FDA faz.

M&M – Quanto das vendas da Philip Morris hoje são de cigarros e de produtos “smoke free”?

Di Giovanni – Mais ou menos 15% da nossa receita vem do Iqos hoje em dia. Não é pouco, mas a ideia é que um dia toda a receita venha do Iqos.

M&M – Tem um prazo para isso?

Di Giovanni – Temos uma meta intermediária. Queremos que em 2025 40% das nossas receitas e volume de vendas sejam relacionados a produtos que não queimam, o que significa atingir 30 milhões de fumantes ao redor do mundo. Mas mais que 80% de nossa pesquisa e desenvolvimento já é só relacionada a produtos que não tenham combustão. Desde 2008, investimos US$ 6 bilhões em pesquisa, desenvolvimento e comercialização.

M&M – Você trabalha na PM há quase 20 anos. Que mudanças destacaria nessa indústria, do ponto de vista de comportamento do consumidor e do negócio nesse tempo?

Di Giovanni – Mudou enormemente. Comecei com cigarro e nosso problema maior era discutir leis extremas, mas que, afinal, faziam sentido, porque cigarro faz mal. Todo mundo sabe, tem documentos do governo brasileiro de 1954 que falam isso, mas sempre é preciso lembrar. Mas a energia que temos agora dentro da empresa, com essa mudança é outra. O propósito mudou totalmente, temos uma história boa para contar. Temos um produto que faz menos mal, que pode ajudar os fumantes e a saúde pública. A vontade de mudar na empresa é muito grande. Isso faz as pessoas trabalharem muito mais, é o lado negativo (risos), mas por outro lado isso é melhor, porque as pessoas estão mais motivadas. Nosso trabalho também ficou mais complicado. Vender um cigarro era relativamente fácil, só pensava na ação de venda, que acontece em 30 segundos. O produto que tem eletrônica precisa explicar o que é, como funciona. E depois que a pessoa comprou, checar se consegue usar. E não queremos que quem compre Iqos continue a usar cigarro, o que envolve nos comunicarmos continuamente com eles, para ter certeza de que não voltem ao cigarro. Tem o pós-venda, porque envolve eletrônica, uma ciência cara.

M&M – Qual a precificação trabalhada para esses produtos?

Di Giovanni – Temos dois modelos um por mais ou menos US$ 50, dependendo do país, e um por mais ou menos US$ 110.

M&M – Se as cobranças para que as marcas tenham propósitos e abracem causas continuarem no ritmo que andam hoje, acredita que a Philip Morris poderá ter de mudar, um dia, completamente de ramo de atuação?

Di Giovanni – É isso que queremos, que um dia não existam mais cigarros e a gente só trabalhe com produtos sem combustão. E como temos tecnologia e ciência, há outras portas que começam a se abrir. Porque essa tecnologia pode ser usada para outros objetivos e produtos. A nicotina, por exemplo, tem vários usos. É possível fazer vacina com a nicotina. Temos participação numa empresa que faz vacina para várias doenças usando a nicotina, mas ainda não publicamos os dados, estamos trabalhando neste sentido. Quando você consegue vaporizar uma substância, pode fazer isso para várias razões. São coisas que estamos começando a ver agora, é cedo para falar delas, mas claramente estão abrindo portas. Há um mês, anunciamos um investimento numa empresa de seguros de vida no Reino Unido, porque percebemos que os seguros hoje em dia tratam do mesmo jeito quem fuma e quem usa produto que não tem queima e vimos que isso precisa mudar, que tem uma oportunidade de negócio aí. Por isso, investimos na Reviti. Então, claramente estão se abrindo outras portas e estamos trabalhando nesse sentido.

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